A bandeira do Rio Grande do Sul, que herdou as cores da antiga República Rio-Grandense, carrega um rico simbolismo que remonta à Revolução Farroupilha (1835-1845). Cada cor – verde, amarelo e vermelho – reflete tanto aspectos históricos quanto ideais políticos da época. Entender esses significados é essencial para compreender a identidade cultural e política do povo gaúcho.
O verde e o amarelo: herança e unidade
As cores verde e amarelo, presentes tanto na bandeira da República Rio-Grandense quanto na atual bandeira estadual, possuem uma ligação direta com o Império do Brasil. Na heráldica imperial, o verde simbolizava a Casa de Bragança (Portugal), enquanto o amarelo representava a Casa de Habsburgo (Áustria), da qual fazia parte Dona Leopoldina, primeira esposa de Dom Pedro I. Essas cores, portanto, remetiam às famílias nobres que fundaram o Brasil independente.
No contexto da Revolução Farroupilha, porém, o significado dessas cores ganha outra nuance. Mesmo lutando contra o governo imperial, os líderes farroupilhas não buscavam romper totalmente com a pátria brasileira, mas sim rejeitar seu modelo centralizador. Essa ideia é reforçada por um diálogo lendário atribuído a David Canabarro, em resposta a uma oferta de ajuda militar de Juan Manuel de Rosas, da Argentina. Segundo a narrativa, Canabarro teria afirmado que os farrapos prefeririam a união com os monarquistas brasileiros a aceitar qualquer invasão estrangeira. Isso demonstra que a causa farroupilha tinha como base a defesa de um modelo federativo, em vez de uma separação definitiva do Brasil. Segue a transcrição do diálogo:
“O primeiro de vossos soldados que transpuser a fronteira, fornecerá o sangue com que assinaremos a Paz de Piratini com os imperiais, por cima de nosso amor à República está o nosso brio de brasileiros. Quisemos ontem a separação de nossa pátria, hoje almejamos a sua integridade. Vossos homens, se ousassem invadir nosso país, encontrariam ombro a ombro, os republicanos de Piratini e os monarquistas do Sr. D. Pedro II.”. Um aparte: foi traição em porongos?
Walter Spalding, historiador gaúcho, apontou em 1955 que as cores verde e amarelo na bandeira representam a fidelidade à pátria comum e ao ideal de uma federação. Assim, essas cores simbolizam não apenas a ligação com o Brasil, mas também o desejo de um governo mais justo e descentralizado.
O vermelho: sangue, liberdade e conexões internacionais
A inclusão da cor vermelha na bandeira é mais complexa e suscita debates entre historiadores. Uma das interpretações mais populares associa o vermelho ao sangue derramado pelos gaúchos durante os combates da Revolução Farroupilha. No entanto, há também outras explicações, que conectam o vermelho a ideais republicanos e movimentos revolucionários da época.
O professor César Augusto Barcellos Guazzelli sugere que o vermelho pode ter sido inspirado pelos revolucionários platinos, que em 1810 iniciaram a luta pela independência das Províncias Unidas do Rio da Prata (atual Argentina e Uruguai). Na Argentina, o vermelho era associado ao federalismo e, simbolicamente, à luta pela liberdade. Essa influência é visível nos laços políticos, econômicos e culturais entre os farroupilhas e seus vizinhos platinos, fortalecendo a ideia de que o vermelho representava tanto uma inspiração libertária quanto a solidariedade entre movimentos republicanos.
Além disso, o uso do vermelho como símbolo da revolução também se manifestava nos trajes, como o famoso lenço vermelho adotado pelos farroupilhas. Esse costume se perpetuou na cultura política gaúcha, sendo associado a outros movimentos revolucionários no Rio Grande do Sul, como as revoluções de 1893 e 1923.
A bandeira como símbolo de união e luta
Desde o início, a bandeira da República Rio-Grandense refletia os ideais de seus criadores. Sem o brasão central que conhecemos hoje, ela trazia apenas as três faixas – verde, amarela e vermelha – e era entendida como uma representação da luta pela liberdade e pelo federalismo. Mesmo após o fim da revolução, esses ideais permaneceram enraizados no imaginário coletivo do povo gaúcho.
Hoje, a bandeira do Rio Grande do Sul mantém seu significado histórico como um símbolo de resistência, liberdade e unidade. As cores, enquanto evocam as lutas do passado, também reafirmam o orgulho de uma identidade que, embora profundamente conectada ao Brasil, carrega consigo a marca da luta por autonomia e justiça.